Para Sempre 2.0

Querido diário,

Hoje, parece que nunca é "para sempre". 

"Os avós eram da mesma aldeia. Conheceram-se em miúdos e antes de atingirem a maioridade, mas já a saber o que era a vida, sabiam que acabariam por envelhecer juntos.

Os pais, um pouco mais tarde, mas ainda assim cedo, disseram o sim e já passaram os 30 anos juntos. Para nós, vintes, o "para sempre" pouco para sempre encerra. Quem se atreve hoje a verbalizar um "para sempre"? Há quem o vá cuspindo aqui e ali, como se o quisesse semear.

Todavia, quase ninguém o diz como os avós ou os pais o disseram. Sim, podemos defender que estamos a elaborar uma versão 2.0 do "para sempre". Uma versão adaptada aos nossos dias, que vai ao encontro de um "post" nas redes sociais. Fácil de dizer e divulgar, igualmente simples de apagar e fingir que não aconteceu.

Parece-me que há adaptação, mas Darwiniana. Se não se adaptar, o "para sempre" morre. Quem nos censura? O "para sempre" de antes provinha de um somar de condições que hoje não conhecemos.

Os apaixonados, com sorte da mesma rua, conheciam-se, namoravam, casavam e por lá ficavam numa casa que herdaram. O trabalho durava até lhes cansar o corpo e o corpo cansado pedir descanso. Na casa herdada, viam crescer os filhos, muitos, a quem trocavam os nomes. Os filhos dos filhos, já menos e com nomes mais curtos, e o bisneto Martim.

Percebiam que a família pouco mais iria crescer devido às atualizações do "para sempre". Agora, ela trabalha em Bragança, ele em Lisboa. Encontram-se quando se encontram as folgas. Ele ficou no T0, ela fez as malas e levou-as para a Suíça. Só assim vão conseguir pagar o espaço onde esperam um dia viver.

Mas os amigos deles estão numa situação pior. Ela está a fazer um estágio profissional, ele à procura do primeiro emprego. Ambos em casa dos pais, mas já perto dos 30. Nenhum destes casais disse ainda o "para sempre" à frente de um padre, familiares e amigos. Não o querem ou não podem pagá-lo. Dizem-no um ao outro, a medo. Medo não do que sentem, mas das muitas ruas que os separam. "

Fonte: http://p3.publico.pt/actualidade/9407/para-sempre-20

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